Naquele dia o tempo estava bom, o céu estava claro, quase não ventava e não estava exatamente quente, mas a temperatura que andava baixa estava mais alta. Mas repito, não estava quente. Eu, por exemplo, estava usando camiseta e calça jeans, andando de um lado para o outro e mesmo assim não suava. Isso é importante para a nossa história.
O dia de trabalho começou bem cedo. Tudo normal. Até a hora do castelo.
Me refiro a um castelo de água. Sabe, aquilo que parece um caixa d'água gigante?
A água, geralmente, chega ao condominio, fábrica e etc e vai direto para cisterna, de lá uma bomba joga essa água até um reservatório alto, mais alto que as caixas d'água, de onde será feita a distribuição. Um castelo é como um estação elevada.
Enfim, resumindo: Castelo é um lugar alto pra caramba!
Entendeu? Então vamos voltar a minha história.
Meu trabalho, entre outras coisas, era medir e fotografar um condomínio a se reformar. O Castelo do condominio também precisava ser medido e fotografado. Evidentemente.
Então, chegou a vez dele. Para chegar ao castelo nós precisavamos ir até o telhado de um dos prédios do condominio, 5 andares do chão, e lá subir por um escadinha feita com ferros.
Ok, comecei a subir.
Na subida me dei conta do quão alto eu estava e percebi, assim de uma hora para a outra, que não possuo asas.
Uma escorregada, um vento mais forte ou um leve desmaio me mataria.
Foi ali, naquela escada, que conheci o pânico.
Minhas pernas tremiam e minha mão suava. Mas eu não tinha escolha, só havia dois caminhos: Pra cima, ou a morte lá em baixo.
Dei a mão ao pânico subi. Pois naquele momento eu achei que o pânico era melhor que a morte... Depois eu repensei isso.
Cheguei lá em cima e tive um daqueles momentos dramáticos da vida.
Eu não conseguia ficar em pé no castelo. Minha perna tremia e minha mão suava. Meu coração não seguia uma sequencia lógica, não que eu me importe com sequencias lógicas, pra mim só de ele ainda estar batendo já era um alivio, meu pulmão por exemplo, esqueceu de funcionar, me vi ali, sem respirar... Parado.
Engraçado é que nessas horas as pessoas dizem que pensam em tudo e todos. Eu não, simplesmente não via nada na minha cabeça, só um desejo absurdo de estar no chão.
Não pensei na minha familia nem no meu amor. Só pensei no chão. No chão e na morte.
No chão. Na morte. E na escada.
Eu precisava descer, mas a escada parecia tão longe. Minhas pernas não mais me obedeciam.
Aliás, acho que nada mais me obedecia.
Meu pulmão, lembram dele? Ainda estava esquisito. Ele puxava o ar tão devagar que era quase imperceptível. Acho que ele tinha medo de puxar ar de mais e com isso eu perder o equilíbrio.
Equilibrio aliás que não subiu comigo. Ele ficou lá embaixo, onde era seguro.
Muito esperto.
Usei então minha ultima pastilha de coragem.
Caminhei até a escada e me agarrei nela pensando: VOU SOBREVIVER!
Comecei a descer.
Enquanto descia pensava.
Não, ainda não era na familia, no amor ou em poesias. Eu só pensava em coisas como a coragem.
A coragem é um medo disfarçado.
Existe o medo que te trava e existe o medo que te faz se mover. A este ultimo alguém denominou coragem.
Cheguei no telhado.
Aí sim pensei na familia, amor e até lembrei de uma poesia.
Mas foi coisa rápida. Não queria perder tempo pensando, corri pra um lugar seguro e sentei.
O mundo ainda estava girando.
Sabem labirintite?
Pois é, eu tenho.
Eu estava com vontade de vomitar.
Minhas mãos estavam molhadas ainda, mas meu pulmão voltou a funcionar.
Ele tentava compensar o tempo que ficou em pane e tentava sugar todo o ar ao redor. Minha respiração fazia barulho. Minha cabeça latejava. Cada batida do meu coração era como uma martelada na minha cabeça.
Eu pensei em rir. Mas não consegui.
Pensei na minha casa.Mas estava em um telhado.
Pensei em ligar pra alguém, pra falar: "Opa! Tudo bem com você? Pois comigo não esta nada bem..."
Mas minha mãe estava sem telefone, minha namorada ia ter nojo por eu estar com vontade de vomitar e a maioria dos meus amigos não iria acreditar em mim.
Então continuei ali, sentado, pensando na vida.
Isso demorou alguns segundos... Aí voltei ao normal.
Desci do prédio e continuei meu trabalho. Em paz. E com a certeza de que nunca mais irei subir em um castelo.
Não sem estar amarrado.